Kisunla no Brasil: Venha saber a realidade…

Por Maramélia Miranda, neurologista, CRM-SP 88.549, RQE 97.572. 

Atualizado em 9 set 2025.

Famílias aflitas, sofrimento geral, matérias na imprensa, sites de advogados prometendo ganhos em ações judiciais contra planos, contra o SUS…

Muita esperança sendo depositada nestas famílias, com a chegada, no Brasil, de um medicamento novo para o tratamento da Doença de Alzheimer, o Kisunla (Donanemabe), prometido pela companhia farmacêutica como inovação farmacológica capaz de desacelerar, barrar o avanço da doença.

É isso mesmo? Venha saber detalhes…

Qual o princípio do tratamento com Kisunla (Donanemabe)?

É um anticorpo monoclonal IgG1, em formato endovenoso, que comprovou-se eficaz em reduzir drasticamente, fazer um verdadeiro clareamento das placas de amilóide cerebrais em portadores de Alzheimer. A presença de placas de amilóide é uma alteração patológica vista como uma causa importante para o declínio cognitivo progressivo que ocorre na Doença de Alzheimer.

Este medicamento foi estudado em ensaios clínicos controlados (TRAILBLAZER-ALZ2), e já foi aprovado pela agência de medicamentos americana, o FDA. Entretanto, é importante informar que outros dois grandes players no sistema internacional de regulação de medicamentos, a agência européia EMA, e o sistema de saúde inglês NHS, não aprovaram esta medicação. Esta não aprovação se deveu primordialmente pelos resultados dos ensaios clínicos publicados, que demonstraram uma eficácia muito baixa, modesta, em relação aos sintomas clínicos de memória, disfuncionalidade e comportamento da doença, associado ao fato de efeitos colaterais potencialmente sérios em boa parcela dos pacientes tratados (cerca de 25-40%), incluindo morte, edema cerebral e AVC hemorrágico.

Além disso, considerando-se análises de custo-efetividade, trata-se de uma droga ainda com alto custo, quando se avalia a necessidade de extensa lista de exames prévios ao início da medicação, infusões contínuas mensais, e necessidade de monitoramento com ressonâncias magnéticas do crânio regulares.

A agência regulatória de medicamentos nacional (ANVISA) aprovou o medicamento em Abril de 2025.

Quem pode tomar o medicamento Kisunla (Donanemabe)?

As indicações previstas em bula, do Kisunla:

  • Pacientes com diagnóstico Doença De Alzheimer – apenas em fase inicial, que são a presença de comprometimento cognitivo leve ou demência leve.
  • É necessária a comprovação da Doença de Alzheimer por algum tipo de biomarcador, ou exame de Liquor com pesquisa dos biomarcadores de DA, ou exame de PET-Amilóide demonstrando o acúmulo de amilóide; além disso, é necessário fazer o teste genético de pesquisa do gene ApoE ε4 (homozigotos). Só pode receber a medicação os pacientes que tiverem uma cópia (heterozigotos) ou nenhuma cópia deste gene.

Há uma lista extensa de contraindicações ao medicamento:

  • Portadores de angiopatia amilóide cerebral
  • Portadores de múltiplas doenças graves (cardiopatia, doença hepática, hematológica, reumatológica grave)
  • Câncer diagnosticado nos últimos 5 anos
  • Portadores do gene ApoE ε4 homozigotos
  • Pacientes que não podem realizar ressonância magnética do crânio
  • Usuários de anticoagulantes.

O Kisunla (Donanemabe) vai ser dispensado pelo SUS?

Não. Este remédio não foi avaliado e muito menos liberado como medicamento da cobertura do sistema de saúde brasileiro – SUS, aqueles listados na RENAME.

Problema? Custo alto, eficácia muito baixa, sem cobertura de planos de saúde privados. Resultados de peqsuisas ainda bastante iniciais, e modestos.

O Kisunla (Donanemabe) pode ter cobertura por planos de saúde privados?

Não. Pelo menos não ainda, pois essa regulação ocorre quando a ANS – Agênci Nacional de Saúde, atualiza o seu rol de cobertura – lista de coberturas obrigatórias em planos privados de saúde no Brasil. No momento, não há nenhuma perspectiva disso acontecer. O rol de coberturas obrigatórias atual da ANS não disponibiliza nenhuma obrigatoriedade de medicamentos para Doença de Alzheimer.

Como ter acesso ao novo medicamento donanemab?

Por enquanto, apenas pacientes que podem custear este tratamento do seu próprio bolso estão tendo acesso, anteriormente a setembro de 2025, importando a medicação, e atualmente, por meio de compra direta e acesso em laboratórios e clínicas que realizam a infusão. As infusões são por via endovenosa, mensais, a cada 4 semanas, e devem ser realizadas em ambiente de clínicas de saúde ou clínicas de infusão, similar ao que acontece em determinados tipos de quimioterapia e infusões para doenças reumatológicas e neurológicas.

LINKS

Aprovação ANVISA. Abril 2025. Registro da agência e detalhamento de indicações em bula. 

Sims et al. Estudo TRAILBLAZER-ALZ2. JAMA 2023. 

Antiepilépticos: Mecanismos de ação, doses e indicações

 

Por que saber tudo sobre os antiepilépticos é importante?
Os fármacos antiepilépticos (FAEs) são a base do tratamento da epilepsia e muito importantes no tratamento das crises sintomáticas agudas, atuação frequente de neurologistas, mas sua eficácia e segurança dependem da escolha correta, ajuste e titulação de dose, e a correta compreensão dos mecanismos farmacológicos. Adaptei aqui uma tabela comparativa de drogas antiepilépticas, com doses, mecanismos de ação de antiepilépticos, e indicações específicas para cada tipo de crise, que irão te ajudar a escolher o melhor antiepiléptico para cada diferente situação:

  1. Precisão Terapêutica: Escolher o FAE errado pode não controlar as crises (Ex.: carbamazepina em ausências).

  2. Minimizar Efeitos Adversos: Fenobarbital causa sedação e problemas cognitivos a longo prazo; valproato tem risco hepatotóxico; qual a dose correta de levetiracetam para epilepsia.

  3. Personalização: Epilepsias focais vs. generalizadas exigem abordagens distintas.

 

LINKS

Pinto et al. Practices in the prescription of antiseizure medications: is it time to change? Arq Neuropsiq 2024. Excelente artigo de revisão, bem prático, sobre os antigos e atuais anticrise, comentando a respeito de uso em gestação, efeitos adversos e dicas práticas em comorbidades. 

Protocolo de fisioterapia para pacientes com AVC agudo

Publicação oficial endorsada pela ABN – Academia Brasineira de Neurologia e Associação Brasileira de Fisioterapia Neurofuncional – ABRAFIN. Inclui recomendações na fase aguda do AVC, atividades e indicadores de qualidade a serem considerados.

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Maso et al. A physiotherapy protocol for stroke patients in acute hospital settings: expert consensus from the Brazilian early stroke rehabilitation task force. Arq Neuropsiq 2025.

Arquivo suplementar I

Protocolo em português – AQUI

Campos de golfe e Doença de Parkinson…

 

A história de pesticidas… Estudo super recentemente publicado do tipo casos-controle, pegou pacientes com Doença de Parkinson (DP) e controles normais da região de Rochester, durante 25 anos de dados registrados, conduzido por pesquisadores da Brown University e da Mayo Clinic.

Analisando-se 419 casos novos de Parkinson idiopático, e comparando-se com 5113 controles, morar a uma milha de um campo de golfe associou-se a 126% maior chance de desenvolver DP, comparando com pessoas morando a mais de 6 milhas de campo de golfe (OR 2.26; 95% CI, 1.09-4.70). Pessoas morando em áreas com serviço de água próximos a campos de golfe também: OR 1,96 (quase 2x a chance de ter DP). Apesar de não demonstrar causalidade direta por ser um estudo observacional de casos-controle, a hipótese de usuários de água vulnerável nestas regiões e exposição a pesticidas é a mais comentada pelos pesquisadores envolvidos na pesquisa…

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Krzyzanowski elt al.Proximity to Golf Courses and Risk of Parkinson Disease. JAMA Open Network 2025.

 

Cura ou regressão da Doença de Alzheimer? Aqui, a Verdade!!!!

Assunto importante nos últimos dias!!!

ATENÇÃO! A VERDADE! …

O público em geral comecará a ver muitos perfis de médicos oferecendo a “cura” ou “regressão de sintomas” para #demencia e para o #Alzheimer, com drogas novas recentemente aprovadas por agências que regulam drogas e medicamentos, no mundo e Brasil. Cuidado… MUITO CUIDADO!

Não existe cura. Não existe milagre. Não existe regressão de sintomas.

Estas drogas novas estão sendo usadas, é um começo de esperança para tratar a doença. Mas nada de realmente efetivo, de efeito consistente em resultados que realmente impactem a evolução desta terrível doença que afeta milhões em todo o mundo.

Não à toa, agências na Europa, Reino Unido, e outros países com regulação restrita, têm barrado o uso indiscriminado das novas terapias…

A verdadeira estratégia é escolher bem o profissional que cuida de seu familiar, verificar suas credenciais, sua formação médica e de residência, especialização, se possui RQE no conselho de seu estado, e PRINCIPALMENTE, adotar a #prevencao , com o controle de tudo que está na figurinha destacada.

Se virem anúncios de cura, reversão e milagres sendo prometidos. ABRAM O OLHO! DESCONFIE. E fuja deste profissional.

Trata-se de informação FALSA.

Terapias para dor neuropática: Atualização 2025

Esta metanálise foi feita pelo grupo de Dor Neuropática da IASP (International Association for the Study of Pain), como forma de atualização de suas diretrizes, avaliando 313 ensaios clínicos e totalizando 48.789 pacientes portadores de dor neuropática de diversas etiologias. O artigo foi recentemente publicado na Lancet Neurology, e seu acesso está aberto, dada a importância do tema na prática neurológica geral.

Resultados

Eficácia primária e desfechos de segurança para:

  • Tricíclicos: NNT=4·6 (95% CI 3·2–7·7), NNH=17·1 (11·4–33·6)
  • Ligantes α2δs (análogos GABA): NNT=8·9 (7·4–11·10), NNH=26·2 (20·4–36·5)
  • Inibidores de recaptação serotonina/noradrenalina (Duais): NNT=7·4 (5·6–10·9), NNH=13·9 (10·9–19·0)
  • Toxina botulínica: NNT=2·7 (1·8–9·61), NNH=216·3 (23·5–∞)
  • Patch capsaína 8%: NNT=13·2 (7·6–50·8), NNH=1129·3 (135·7–∞;)
  • Opióides: NNT=5·9 (4·1–10·7), NNH=15·4 (10·8–24·0)
  • TMS repetitiva (sessões): NNT=4·2 (2·3–28·3), NNH=651·6 (34·7–∞)
  • Creme tópico de caspaína: NNT=6·1 (3·1–∞), NNH=18·6 (10·6–77·1)
  • Patch de lidocaína 5%: NNT=14·5 (7·8–108·2), NNH=178·0 (23·9–∞).

Conclusões: Recomendação forte para o uso de tricíclicos, análogos GABA e inibidores de rcaptação duais como primeira linha de tratamento. Menor força de recomendação para capsaína e lidocaína em patch; e terceira linha de tratamento para rTMS, toxna bolulínica e opióides. Tabelinha resumindo o artigo, abaixo (clique em cima da imagem para ver em close).

 

 

LINKS

Soliman et al.Pharmacotherapy and non-invasive neuromodulation for neuropathic pain: a systematic review and meta-analysis. Lancet Neurol 2025.

Material suplementar.

Classificação nova (de novo!) da ILAE para Crises Epilépticas

Olha…
Quem deseja dar uma esganadinha na ILAE?! Levanta a mão!!!!!  kkkkkkkkkk

Sei não… Já estou achando que essa coisa de trocar os nomes termos classificação praticamente a cada dois anos é proposital, apenas pra obrigar a gente que é neurologista a estudar tudo de novo…

Olhem essa timeline de mudanças de nomes e termos…

E aqui… Os termos novos…

 

LINKS

Beniczky et al. Updated classification of epileptic seizures: Position paper of the International League Against Epilepsy Epilepsia 2025.

Beniczky et al. Updating the ILAE seizure classification. Epilepsia 2025.

Bebam vinho… !!!!!! E sejamos felizes, e saudáveis!!!!!

Este artigo publicado na European Heart Journal, publicação da European Society of Cardiology, a poderosa ESC, veio bem a calhar neste último dia do ano. Deliciem-se com seus resultados…

A new study has found that moderate wine consumption, measured through urinary tartaric acid levels, is linked to a lower risk of cardiovascular disease in older adults. Drinking 12-35 glasses of wine per month showed significant cardiovascular benefits over nine years. This research builds on previous studies suggesting health benefits from moderate wine drinking but uses urinary tartaric acid as a more accurate measure of wine intake. This method reduces bias from self-reported alcohol consumption. The findings indicate that higher tartaric acid levels correlate with lower cardiovascular risk, while lower levels do not show the same benefits. The study highlights the potential role of wine’s bioactive compounds in promoting heart health.

ESTUDO

Pegaram amostras de urina de pacientes randomizados no grande e importante estudo clínico PREDIMED, estudo espanhol com mais de 7000 participantes, que avaliou desfechos cardiovasculares em indivíduos expostos à dieta mediterrânea. Entre 1232 participantes, um grupo teve desfechos cardiovasculares e o outro grupo não apresentou desfechos; neste subset de participantes que tinham medidas de ácido tartárico basal, e após um ano da intervenção, na urina, foram feitas as análises com base na dosagem de ácido tartárico urinária e eventos CV. O consumo de vinho, registrado usando questionários validados, foram comparados com as medidas de ácido tartárico, demonstrando correlação linear.

RESULTADOS

Beber de 12 a 35 tacinhas de vinho por mês foi a quantidade mais protetora para a ocorrência de eventos cardiovasculares…

(HR 0.50 (CI 0.27-0.35), redução de 50% de chance de ter eventos…

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SyNC: Nova sigla no pedaço!!!!!

Chega de hematoma subdural e meníngeas médias???? Depois de uma semana cheia disso por todos os lados, hoje vamos relaxar nossa sexta-feira com SyNC.

SyNC é a mais nova sigla queridinha dos neurologistas vasculares: Symptomatic non-stenotic carotid plaques (SyNC), ou abrasileirando, placa carotídea não-estenótica, é uma causa recentemente descrita de AVC isquêmico, correspondendo à presença de uma lesão aterosclerótica carotídea cervical que tem padrão ou padrões de maior risco para embolia artério-arterial, e cuja estenose estimada pelos métodos de imagem não atinge o limite clássico de estenose >50-70%, que foi o cutpoint utilizado nos estudos de aterosclerose de grande artéria extracraniana, como o antiguinho NASCET e as séries de estudos CREST.

Aqui está, dando já uma ideia aos colegas que querem saber e estudar mais, um tópico super quente na nossa área de Neurovascular. Não sabemos muito bem ainda: a) Quais seriam os potenciais preditores de maior risco; b) Melhores tratamentos preconizados (clínico? medicamentoso? endovascular com angioplastia/stenting?); c) Como estudar bem e de forma mais acurada esta doença.

Figura: Exame de US de carótidas com uma placa pequenininha hipoecogênica, em um paciente masculino de 49 anos, que teve amaurose fugaz no olho ipsilateral à placa. SyNC (arquivo pessoal).

Mais tarde, vou terminar este post, e publicar as referências principais.

Por enquanto, fiquem com a siglinha… Pra não esquecerem de mim!!!!

SyNC   ……  SyNC  ………..    SyNC